quinta-feira, 6 de setembro de 2012

OS ENIGMAS DE PABLO NERUDA





Os Enigmas
Perguntastes-me o que fia o crustáceo entre as suas patas de ouro
e eu vos respondo: O mar é que sabe.
Dizeis-me o que espera a caravela no seu sino transparente? O que espera?
Eu vos digo, espera como vós o tempo.
Perguntais-me a quem atinge o braço da alga Macrocustis?
Indagai-o, a certa hora, em certo mar que conheço.
Sem dúvida perguntar-me-eis pelo marfim maldito do narwhal, para que eu vos responda
de que modo o unicórnio marinho agoniza arpoado.

Perguntais-me talvez pelas penas alcionárias que tremem
nas puras origens da maré austral?
E sobre a construção cristalina do pólipo enredastes, sem dúvida,
uma pergunta mais, desfiando-a agora?
Quereis saber a elétrica matéria dos ouriços do fundo?
A armada estalactite que caminha se quebrando?
O anzol do peixe pescador, a música estendida na profundidade como um fio na água?

Eu vos quero dizer que isso quem sabe é o mar, que a vida em suas arcas
é larga como areia, inumerável e pura
e entre as uvas sanguinárias o tempo poliu
a dureza de uma pétala, a luz da medusa
e debrulhou o ramo de suas fibras corais
de uma cornucópia de nácar infinito.

Eu não sou senão a rede vazia que adianta
os olhos humanos, mortos naquelas trevas,
acostumados ao triângulo, medidas
de um tímido hemisfério da laranja.       

Andei como vos arranhando
a estrela interminável,
e na minha rede, na noite, acordei nu,
 única pesa, peixe encerrado no vento.

Pablo Neruda (trad.: Eliane Zagury)
NERUDA, Pablo. Antologia Poética. Rio de Janeiro, editora José Olympio,1983. pp 147-149

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